há dias cruzou-se na minha vida uma pessoa muito especial. um antropólogo, professor universitário doutorado, eloquente. cruzou-se comigo numa formação onde estavam mais 35 pessoas, um grupo grande. por sorte ou por falta dela, sempre que houve trabalhos em grupo, nunca coincidiu ficarmos no mesmo, mas havia algo que me impelia a falar com ele, após observar as suas intervenções e formas de agir durante os 8 dias de formação.
tentei abordá-lo num intervalo, mas a conversa foi muito fugaz. entretanto surgiu uma outra possibilidade de conversa informal, num almoço em que ficamos frente a frente. enchi-me de coragem e atrevi-me a entrar no seu mundo, dizendo -
sabes, fazes-me lembrar muito o meu filho mais velho. -
a sério? porque dizes isso? - e a talho de foice lá fui revelando a forma de ser e agir do meu menino, as dificuldades na escola e nas interações sociais e a minha preocupação no desafio de o educar por entre o amor incondicional e a forma mais rígida a que, muitas vezes. recorria na tentativa de o preparar para o mundo.
- estou a rever nas tuas palavras o menino que eu fui... - e então abriu-se e falou-me sobre o seu percurso na infância, do que sofreu com a exclusão, o quanto se sentia solitário, as dificuldades na escola (sobretudo na matemática, como o meu zizinho), os medos e fobias. ainda hoje, apesar de ser um homem profissionalmente realizado e independente, considera-se solitário, hipocondríaco, incompreendido, com algumas obsessões. precisa do seu mundo para se refugiar, as suas músicas, os seus livros.
esta conversa, que para mim foi libertadora, para ele foi dolorosa. no fim, abraçamo-nos com alegria, senti uma imensa gratidão!
- o teu filho deve ser um miúdo fantástico!
- é, o meu filho é um miúdo fantástico. gostava que um dia o conhecesses.
e daí em frente temos mantido contacto.
as emoções que senti ao perceber que a minha missão é ensinar o meu filho a ser feliz acima de tudo, ensinando-lhe estratégias para se adaptar, minimamente, aos outros e ao contexto, foram o inicio de uma caminhada, desafiante e muito inspiradora.
cheguei a casa e contei ao joão. nesse momento, continuei a minha "libertação" de emoções e chorei, chorei, chorei. sei que, embora não o consigamos demonstrar da mesma forma, a nossa intenção é a mesma, o que queremos é que os nosso filhos sejam felizes, realizados, mas felizes. e fizemos um pacto no tipo de disciplina e educação para com eles. não temos que os moldar ao nosso conceito do "ideal", temos que os respeitar na sua forma única de ser, com amor, com paciência, com resiliência. eles terão, no seu futuro, a riqueza destes ensinamentos também na sua forma de agir e viver.
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